Já muito se falou, especulou e
escreveu sobre o Nemátodo da Madeira do Pinheiro, desde que este organismo
microscópico foi encontrado em pinhais da Península de Setúbal, em 1999. Em
Portugal, esta doença tem afectado, sobretudo, pinhais adultos na região de
Setúbal e na região Centro, onde está a progredir rapidamente em grande parte
do pinhal bravo dos distritos de Coimbra, Leiria e Viseu.
Pinheiros mortos pela acção do NMP - região Centro |
É na região Centro que este
problema fitossanitário assume uma dimensão mais preocupante. Numa floresta
dominada pela pequena e muito pequena propriedade privada, com proprietários
que, na sua maioria, não praticam uma gestão activa do pinhal e onde muitas
propriedades não têm sequer “dono conhecido”, torna-se muito difícil a luta
contra este problema fitossanitário.
De acordo com os resultados do
último inventário florestal nacional (2005/06), o pinheiro bravo ocupa 885.000
hectares - 60% na região Centro. Todavia, a área ocupada por esta espécie encontra-se
em recessão desde finais da década de 70, tendo-se acentuado nos últimos 20
anos, com a perda de mais de 300.000 ha de floresta de pinho. O actual contexto
social de despovoamento do interior do país, a elevada vulnerabilidade ao fogo,
a incidência crescente de factores bióticos (com destaque para o nemátodo) e a
desvalorização do preço da madeira, exercem um papel determinante na actual
tendência negativa que se assiste no pinheiro bravo, que, ainda assim, continua
a ser a principal espécie da floresta portuguesa.
Segundo o INE (Contas Económicas
da Silvicultura 2009) a produção de madeira para serrar, durante o ultimo
decénio, tem apresentado uma tendência decrescente, destacando-se os anos de
2008 e 2009 pelas diminuições pronunciadas de preços (-10,0% e -6,0%,
respectivamente). Acresce, desde 2008, a imposição de Bruxelas da
obrigatoriedade do tratamento térmico de toda a madeira de pinho destinada ao
mercado externo. Uma conjuntura negativa que teve como consequência o encerramento
de um conjunto significativo de pequenas empresas de serração na região Centro,
sobretudo de empresas familiares que não se modernizaram. Tudo somado, é fácil
constatar as dificuldades que a fileira do pinho atravessa, que é agravada pela
incerteza no futuro resultante da procura crescente de material lenhoso pela indústria
de bioenergia (“pellets”).
A situação preocupante que hoje
se regista na fileira do pinho resulta, portanto, da conjugação do abrandamento
e contracção da actividade económica observados nos últimos anos, mas também da
desvalorização da madeira de pinho em virtude dos problemas com o Nemátodo da
Madeira do Pinheiro e das consequentes restrições à exportação, nomeadamente de
paletes que é o destino de mais de metade da madeira serrada em Portugal.
Da minha experiência profissional,
considero que o Nemátodo da Madeira do Pinheiro é um problema fitossanitário
complexo, cuja solução, no quadro mais amplo da fileira do pinho, exige uma visão
estratégica, de médio/longo prazo. Neste domínio concreto, as Organizações de
Produtores Florestais e as ZIF assumem um papel decisivo na mudança do
paradigma. Também, é importante envolver as autarquias e os seus Gabinetes
Técnicos Florestais nesta acção. Estes agentes podem desempenhar uma função
importante na monitorização e na informação e sensibilização dos proprietários
florestais para este e outros problemas fitossanitários.
Ao Governo e aos organismos da
Administração Publica com responsabilidade neste domínio – a Direcção-Geral da
Agricultura e Desenvolvimento Rural e a Autoridade Florestal Nacional (AFN) – compete
a condução deste “dossier politico, económico e fitossanitário” junto das
instâncias comunitárias. Importará ao Governo manter o rumo na estratégia de
controlo da dispersão da doença, com um controlo efectivo da execução das
medidas adoptadas no Programa de Acção Nacional para Controlo do Nemátodo da
Madeira do Pinheiro e em articulação com os agentes do sector. O protocolo
assinado em Novembro de 2010, no valor de 6,8 milhões de euros, entre a AFN e as
Federações de Produtores Florestais foi um passo importante nesse sentido.
A solução deste problema complexo
não se compagina com uma acção governativa errática. Exige-se uma visão de
longo prazo, com o empenho responsável de todos – Estado, Organizações do
sector e da indústria transformadora, centros de investigação, autarquias e,
sobretudo, dos proprietários e produtores florestais. Em suma, o país
precisa, urgentemente, de uma política de fitossanidade florestal.
O financiamento público dessa
política é, sem dúvida, um aspecto importante, quer por via do Fundo Florestal
Permanente, quer em sede dos fundos e programas comunitários. É preciso agir de
uma forma mais efectiva e integrada nos espaços florestais. É preciso gerir a
floresta de forma mais profissional e sustentável, com planeamento dos cortes e
dos tratamentos silvícolas que permitam obter maior produtividade e material
lenhoso com mais valor acrescentado e que, simultaneamente, assegure o controlo
do declínio do pinhal.
Acredito que a fileira do pinho
tem futuro em Portugal. Importará criar os mecanismos necessários para estruturar
e dinamizar o mercado de madeira e tornar rentável ao proprietário o
investimento na arborização e na gestão activa do pinhal bravo. É, também, preciso
valorizar a qualidade do material lenhoso e apostar na certificação florestal. Ter
o foco centrado, exclusivamente, no Nemátodo da Madeira do Pinheiro é olhar
para a árvore e não ver a floresta!
Miguel Galante
(Eng. Florestal)
(Eng. Florestal)
Publicado na Gazeta Rural, edição n.º 172
(Fev2012)