sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Nemátodo da Madeira do Pinheiro, um problema sem fim à vista?

Já muito se falou, especulou e escreveu sobre o Nemátodo da Madeira do Pinheiro, desde que este organismo microscópico foi encontrado em pinhais da Península de Setúbal, em 1999. Em Portugal, esta doença tem afectado, sobretudo, pinhais adultos na região de Setúbal e na região Centro, onde está a progredir rapidamente em grande parte do pinhal bravo dos distritos de Coimbra, Leiria e Viseu.
Pinheiros mortos pela acção do NMP - região Centro

É na região Centro que este problema fitossanitário assume uma dimensão mais preocupante. Numa floresta dominada pela pequena e muito pequena propriedade privada, com proprietários que, na sua maioria, não praticam uma gestão activa do pinhal e onde muitas propriedades não têm sequer “dono conhecido”, torna-se muito difícil a luta contra este problema fitossanitário.

De acordo com os resultados do último inventário florestal nacional (2005/06), o pinheiro bravo ocupa 885.000 hectares - 60% na região Centro. Todavia, a área ocupada por esta espécie encontra-se em recessão desde finais da década de 70, tendo-se acentuado nos últimos 20 anos, com a perda de mais de 300.000 ha de floresta de pinho. O actual contexto social de despovoamento do interior do país, a elevada vulnerabilidade ao fogo, a incidência crescente de factores bióticos (com destaque para o nemátodo) e a desvalorização do preço da madeira, exercem um papel determinante na actual tendência negativa que se assiste no pinheiro bravo, que, ainda assim, continua a ser a principal espécie da floresta portuguesa.

Segundo o INE (Contas Económicas da Silvicultura 2009) a produção de madeira para serrar, durante o ultimo decénio, tem apresentado uma tendência decrescente, destacando-se os anos de 2008 e 2009 pelas diminuições pronunciadas de preços (-10,0% e -6,0%, respectivamente). Acresce, desde 2008, a imposição de Bruxelas da obrigatoriedade do tratamento térmico de toda a madeira de pinho destinada ao mercado externo. Uma conjuntura negativa que teve como consequência o encerramento de um conjunto significativo de pequenas empresas de serração na região Centro, sobretudo de empresas familiares que não se modernizaram. Tudo somado, é fácil constatar as dificuldades que a fileira do pinho atravessa, que é agravada pela incerteza no futuro resultante da procura crescente de material lenhoso pela indústria de bioenergia (“pellets”).

A situação preocupante que hoje se regista na fileira do pinho resulta, portanto, da conjugação do abrandamento e contracção da actividade económica observados nos últimos anos, mas também da desvalorização da madeira de pinho em virtude dos problemas com o Nemátodo da Madeira do Pinheiro e das consequentes restrições à exportação, nomeadamente de paletes que é o destino de mais de metade da madeira serrada em Portugal.

Da minha experiência profissional, considero que o Nemátodo da Madeira do Pinheiro é um problema fitossanitário complexo, cuja solução, no quadro mais amplo da fileira do pinho, exige uma visão estratégica, de médio/longo prazo. Neste domínio concreto, as Organizações de Produtores Florestais e as ZIF assumem um papel decisivo na mudança do paradigma. Também, é importante envolver as autarquias e os seus Gabinetes Técnicos Florestais nesta acção. Estes agentes podem desempenhar uma função importante na monitorização e na informação e sensibilização dos proprietários florestais para este e outros problemas fitossanitários.

Ao Governo e aos organismos da Administração Publica com responsabilidade neste domínio – a Direcção-Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural e a Autoridade Florestal Nacional (AFN) – compete a condução deste “dossier politico, económico e fitossanitário” junto das instâncias comunitárias. Importará ao Governo manter o rumo na estratégia de controlo da dispersão da doença, com um controlo efectivo da execução das medidas adoptadas no Programa de Acção Nacional para Controlo do Nemátodo da Madeira do Pinheiro e em articulação com os agentes do sector. O protocolo assinado em Novembro de 2010, no valor de 6,8 milhões de euros, entre a AFN e as Federações de Produtores Florestais foi um passo importante nesse sentido.

A solução deste problema complexo não se compagina com uma acção governativa errática. Exige-se uma visão de longo prazo, com o empenho responsável de todos – Estado, Organizações do sector e da indústria transformadora, centros de investigação, autarquias e, sobretudo, dos proprietários e produtores florestais. Em suma, o país precisa, urgentemente, de uma política de fitossanidade florestal.

O financiamento público dessa política é, sem dúvida, um aspecto importante, quer por via do Fundo Florestal Permanente, quer em sede dos fundos e programas comunitários. É preciso agir de uma forma mais efectiva e integrada nos espaços florestais. É preciso gerir a floresta de forma mais profissional e sustentável, com planeamento dos cortes e dos tratamentos silvícolas que permitam obter maior produtividade e material lenhoso com mais valor acrescentado e que, simultaneamente, assegure o controlo do declínio do pinhal.

Acredito que a fileira do pinho tem futuro em Portugal. Importará criar os mecanismos necessários para estruturar e dinamizar o mercado de madeira e tornar rentável ao proprietário o investimento na arborização e na gestão activa do pinhal bravo. É, também, preciso valorizar a qualidade do material lenhoso e apostar na certificação florestal. Ter o foco centrado, exclusivamente, no Nemátodo da Madeira do Pinheiro é olhar para a árvore e não ver a floresta!


Miguel Galante
(Eng. Florestal)

Publicado na Gazeta Rural, edição n.º 172 (Fev2012)

2011, o Ano das Florestas

 Em 2011 celebrou-se o Ano Internacional das Florestas. Declarado pelas Nações Unidas, foi objectivo promover a gestão sustentável das florestas à escala mundial e dar a conhecer à Sociedade a importância dos bens e serviços prestados pela floresta para a vida na Terra.

Também em Portugal se celebrou o Ano Internacional das Florestas. Por todo o País, realizaram-se inúmeros eventos e iniciativas que viriam a culminar na Assembleia da Republica, com a realização da audição pública parlamentar “A floresta que temos, a floresta que queremos”.

Portugal é um país de florestas! Temos cerca de 40% do território coberto com florestas – 3,45 milhões de hectares, que estão na base de uma fileira industrial moderna e dinâmica e que é responsável por 11% das nossas exportações. Fruto desse dinamismo, actualmente, o cluster florestal é já o terceiro principal sector exportador e apresenta potencial para continuar a crescer.

Para além da economia, a floresta portuguesa desempenha um papel ambiental insubstituível, quer na fixação do dióxido de carbono, quer na conservação da biodiversidade e ainda no combate à erosão dos solos. Também, na vertente social a floresta desempenha uma função impar no mundo rural, nas economias locais e no combate ao avanço da desertificação do interior do país.

Findo 2011, importa fazer um balanço e nesse sentido destacaria cinco registos que marcaram o ano:

1.       Fundo Florestal Permanente, pela primeira vez, apoia a Certificação Florestal. Num valor cifrado em mais de 560.000€, este apoio publico nacional irá permitir adicionar cerca de 100.000ha de floresta certificada até final de 2013.

2.       Novo Governo toma posse em Junho, funde a Autoridade Florestal Nacional com o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade e cria o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.

3.       Assembleia da Republica revoga Código Florestal, sob proposta dos Grupos Parlamentares do PSD e CDS-PP.

4.       APCOR organiza, em Lisboa, o 2.º Congresso Mundial do Sobreiro e da Cortiça, num sinal de recuperação do sector após a crise que o afectou em 2007/2008.

5.        “Ao cair do pano”, o Parlamento associa-se à celebração do Ano Internacional das Florestas e em 22 de Dezembro institui, por unanimidade, o Sobreiro como “Arvore Nacional de Portugal”.

Também, no final do ano o País ficou a conhecer as Grande Opções do Plano do actual Governo para o período 2012-2015. No que respeita ao sector florestal, o Governo preconiza a “redinamização” das ZIF, a realização do “Cadastro Florestal” e a criação de um mecanismo de segurança e gestão de riscos como forma de redução dos riscos de incêndio. Ainda, nesse contexto, considera ser merecedor de “especial atenção” o declínio dos povoamentos suberícolas e o nemátodo do pinheiro.

Apesar das grandes linhas de orientação incidirem em aspectos importantes para o desenvolvimento do sector florestal, desconhecem-se as metas e as medidas preconizadas para as concretizar. Sobretudo, parece-me que o Governo é omisso no essencial: a aposta clara na gestão sustentável das florestas. Numa visão de futuro, para um sector que tem uma acentuada vocação exportadora, o fomento da certificação florestal e a adopção de um regime fiscal ajustado às especificidades da actividade florestal constituem factores decisivos para a gestão activa da floresta e, consequentemente, para a competitividade da fileira florestal nacional!

É unânime a opinião que a fileira florestal pode gerar emprego e riqueza no mundo rural e contribuir para alavancar a economia nacional. Urge estabelecer compromissos duradouros com os agentes do sector e encontrar soluções sustentáveis para enfrentar as fragilidades estruturais da floresta portuguesa. A floresta é o principal recurso natural de Portugal. É importante que o Governo reconheça o seu potencial e coloque a floresta no topo da agenda política.

Termino com votos que, em 2012, os agentes do sector saibam tirar partido do processo de agilização das medidas florestais do PRODER desencadeado em 2010 e 2011 e que este ano fique marcado pela consolidação do investimento na floresta, cujas ajudas públicas ascendem a mais de 440 milhões de euros até 2015.


Miguel Galante
(Eng. Florestal)

Publicado na Gazeta Rural, edição n.º 170 (Jan2012)