O Primeiro-Ministro António Costa esteve em Mação, onde
presidiu às comemorações oficiais do Dia Internacional das Florestas. “Roubei”
o título da peça da TSF sobre essa jornada pela forma perfeita como sintetizou
o discurso feito na ocasião por António Costa, com base na experiência vivida
na primeira pessoa quando vivenciou a tragédia dos incêndios devastadores do
verão de 2005, quando era Ministro de Estado e da Administração Interna.
António Costa, acompanhado do Ministro da Agricultura, Capoulas Santos, no Dia Internacional das Florestas |
“Uma floresta à prova de fogo” representa uma visão política
assente em espaço florestais ordenados, geridos de forma profissional e que
visam aumentar a sua resiliência ao fogo (e a outras ameaças, tais como as
pragas e as doenças) e, simultaneamente, gerarem riqueza aos seus proprietários
e ao País.
De facto, Mação foi uma boa escolha para falar de floresta.
Trata-se de um território que tem sofrido bastante com os incêndios florestais
e que não baixou os braços. Logo após os grandes incêndios de 2003 que
dizimaram quase toda a floresta desse concelho, o concelho de Mação foi
pioneiro a apresentar a solução da gestão integrada do microfundio florestal em
que assentava a mancha de pinhal, ou seja, aquilo que viria a ser consagrado
nas Zonas de Intervenção Florestal. Mais tarde, em 2010, foi em Mação que se
realizou o primeiro Encontro Nacional de Entidades Gestoras de Zonas de
Intervenção Florestal.
De acordo com a informação disponível no ICNF, estão
formalmente constituídas 178 ZIF, que abrangem cerca de 920.000 hectares, encontrando-se
em preparação mais 33 ZIF que cobrem uma área superior a 280.000 hectares. Ou
seja, se tudo correr bem, durante 2016 mais de um milhão de hectares estarão
integrados em ZIF.
E esta é uma dimensão de território florestal que não pode
ser ignorada pelo poder político. Também por isso foi importante a mensagem política
que António Costa deixou em Mação no dia 21 de março, de valorização da
importância do trabalho de “intervenção estrutural” na floresta. E neste
domínio, as ZIF podem assumir um papel central.
Apesar da robustez destes números, a realidade no terreno
evidencia que as ZIF ainda são “gigantes com pés de barro”, ou seja, os
problemas e condicionalismos para a sua operacionalização mantêm-se quase
inalterados, 5 anos depois do encontro nacional de Mação. Os números do ProDeR
são esclarecedores das dificuldades das ZIF na mobilização dos fundos
comunitários para o investimento na beneficiação dos povoamentos florestais ou
na realização de novas arborizações, o que contrasta com a elevada capacidade
de absorção dos dinheiros públicos para as intervenções na Defesa da Floresta
Contra Incêndios, ou para o combate às pragas e doenças… mas neste caso
trataram-se de projectos financiados a 100%.
Mas de Mação veio um outro sinal político importante. O Ministro
da Agricultura, Capoulas Santos, reforçou a meta já anunciada pelo Governo de
recuperação de 150 mil hectares de floresta numa década, com ênfase para o
aproveitamento da regeneração natural de pinheiro bravo. E também neste
desiderato as ZIF podem assumir um papel relevante, diria mesmo, decisivo.
O anterior Governo introduziu um conjunto de alterações
legislativas no Decreto-lei n.º 27/2014, de 18 de fevereiro, que consagraram a
existência legal das “ZIF de administração total”, em que a Entidade Gestora
fica habilitada a proceder à administração integrada de todas as componentes do
sistema agro-silvopastoril inserido na ZIF. No entanto, apesar dessa
“agilização legislativa”, a verdade é que nos territórios onde prevalece a
pequena propriedade as ZIF continuam sem conseguir ter uma implementação
eficaz.
Na prática, subsiste a necessidade por todos identificada
aquando do Encontro Nacional de 2010 “da existência de instrumentos financeiros
que permitam às ZIF contornar a descapitalização da generalidade dos proprietários
florestais aderentes” e, em certa medida, era essa a expectativa do setor em
torno do Dia Internacional das Florestas, a expectativa do Governo anunciar a
estratégia de desenvolvimento para as Zonas de Intervenção Florestal.
"Hoje, temos um sistema de prevenção mais robusto.
Hoje, temos um sistema de combate mais robusto. Mas aquilo que temos de ter,
sobretudo, é uma floresta mais robusta, mais resiliente ao fogo e por isso mais
suscetível de criar riqueza", afirmou, convicto, António Costa e eu assino
por baixo, mas para que essa visão se torne realidade são precisas medidas concretas
de política florestal que tardam a aparecer dos lados do Terreiro do Paço. E,
desse ponto de vista, em Mação perdeu-se uma boa oportunidade para relançar as
ZIF na agenda política e combater o absentismo e o desinvestimento na floresta…
Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 268 (15.4.2016)