Amândio Torres, Secretário de Estado das Florestas e do
Desenvolvimento Rural, anunciou há dias, na primeira reunião do Conselho
Florestal Nacional, o objectivo do Governo de recuperar 150 mil hectares de
floresta no prazo de duas legislaturas. Ainda que apresentado de uma forma
vaga, este é um objectivo importante, sobretudo quando o ultimo inventário
florestal nacional reporta a regressão da área florestal em Portugal e sinaliza
a degradação da floresta existente.
Para concretizar esta desejável reabilitação da floresta, importa
recorrer aos fundos comunitários para estimular o investimento na gestão
florestal e também em novas arborizações. Na programação do PDR 2020 foram canalizados
cerca de 540 milhões de euros de financiamento público para o sector florestal,
representando 13% dos fundos europeus desse programa operacional e um aumento
do envelope financeiro superior a 10% comparativamente ao ProDeR. Trata-se,
portanto, de uma verba significativa que pode (e deve) contribuir, de forma relevante,
para alavancar o investimento produtivo na floresta.
No entanto, conforme alertou recentemente a ANEFA em
comunicado, uma parte significativa dessa verba já está comprometida. Os
próprios documentos da Autoridade de Gestão do PDR 2020 são claros quanto aos
valores já comprometidos no período de transição – 215 milhões de euros, ou
seja, quase metade da verba destinada ao apoio do setor florestal.
Contudo, uma leitura com maior profundidade evidencia um
problema maior, ou seja, mais de 212 milhões de euros estão comprometidos com os
apoios destinados à Medida 8 “Proteção e reabilitação de povoamentos florestais”,
onde se inscrevem as linhas de apoio ao investimento na gestão activa da floresta,
mas também o financiamento da protecção da floresta contra os incêndios e
contra os agentes bióticos. Esta situação levanta um sério problema de
capacidade efectiva de realização de investimento privado na gestão florestal,
pois verifica-se que cerca de metade da verba destinada para esta Medida transitou
comprometida nas linhas destinadas à protecção florestal quando ainda não
chegámos a meio do período de execução do PDR 2020. Aliás, impunha-se que a
Autoridade de Gestão do PDR 2020 publicasse, de forma sistemática, informação
atualizada da verba comprometida e das verbas ainda disponíveis nas várias
linhas de apoio.
Ainda tendo presente os objectivos apresentados pelo
Secretário de Estado das Florestas, existe um outro aspeto que importa ter em
linha de conta – o desinteresse na realização de novas arborizações. Na
vigência do ProDeR, segundo dados oficiais, pouco mais de 16.000 hectares foram
florestados com recurso aos apoios comunitários, o que revela uma perda muito
significativa da dinâmica de florestação registada no âmbito do Reg. (CEE) n.º
2080/92. É muito pouco, diria mesmo, demasiado pouco para um setor da
actividade económica que tem uma indústria de base florestal forte, geradora de
riqueza para o País e com capacidade de produção instalada, mas que se vê
confrontada com um deficit de crescente matéria-prima nacional para laborar.
De igual modo, importa perceber se o actual Governo vai
manter inalterado o regulamento do Fundo Florestal Permanente. Nos moldes em
que foi desenhado pelo anterior Governo em pouco contribuía para um apoio
efectivo da floresta portuguesa, permitindo até canalizar verbas para
“financiar” a comparticipação nacional dos apoios públicos das Medidas
Florestais do PDR 2020, contrariando os propósitos que estiveram subjacentes à
criação deste fundo de financiamento do setor florestal inscritos na Lei de
Bases da Política Florestal e no diploma que o criou em 2004.
Em suma, quando o Governo assume uma aposta forte nas principais
fileiras florestais seria importante que a evolução recente do setor e os
problemas estruturais que continuam a condicionar o desenvolvimento da floresta
portuguesa, associado ao longo retorno do investimento realizado, fossem bem
ponderados antes de apontar publicamente metas concretas. Embora ambiciosa, considero
que a meta anunciada é desejável e exequível no prazo apontado.
Competirá agora ao actual Governo ter o engenho e a vontade
política necessárias para encetar a apregoada “Reforma estrutural do setor
florestal” e para dotar o PDR 2020 de capacidade efectiva de apoiar essa
reforma, reprogramando as verbas associadas às Medidas Florestais se necessário.
O PDR 2020 (e em certa medida também o Fundo Florestal
Permanente) deve constituir um instrumento central no financiamento da política
florestal em Portugal. Nessa perspetiva, era importante que em 2016 fossem
dados claros sinais políticos nesse sentido, criando a necessária base de
confiança para quem pretender investir na floresta em Portugal.
Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 264 (15.2.2016)