sexta-feira, 17 de junho de 2016

O mundo precisa de uma floresta mais verde

No dia 5 de junho celebrou-se o Dia Mundial do Ambiente. Neste ano, a Europa pretendeu assinalar esta data com uma chamada de atenção para as consequências da perda de biodiversidade.

A Serra da Estrela, uma área floresta rica em biodiversidade

A Agência Europeia do Ambiente foi o agente dinamizador dessa sensibilização, tendo colocado uma forte ênfase na ação que a Rede Natura 2000 tem desempenhado na protecção e reabilitação dos ecossistemas naturais mais ameaçados no espaço da União Europeia. Nesta ação de sensibilização, a Agência Europeia do Ambiente recuperou uma outra mensagem que ganha força crescente na agenda política europeia - Uma gestão sustentável é a chave para florestas saudáveis na Europa! (já retomaremos este tema).
Em Portugal, o Dia Mundial do Ambiente foi assinalado com a realização de um Conselho de Ministros Extraordinário dedicado ao Ambiente no coração da Serra da Arrábida, num claro sinal politico de regresso da temática ambiental ao topo da acção governativa.
Neste Conselho de Ministros, entre outras medidas, gostaria de destacar a aprovação da criação de um único fundo ambiental resultante da fusão dos fundos atualmente existentes - Fundo Português de Carbono, Fundo de Intervenção Ambiental, Fundo de Proteção dos Recursos Hídricos e Fundo para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade. Esta é uma decisão política que pode trazer impatos positivos para a floresta portuguesa.
Esta medida visa garantir uma maior eficácia no financiamento das políticas ambientais e os ecossistemas florestais, certamente, também poderão vir a beneficiar desses apoios públicos. A floresta gera um conjunto muito significativo de serviços ambientais importantes. A protecção dos solos, a regulação dos recursos hídricos, o sequestro do CO2 ou a preservação da biodiversidade, de que os montados de sobro e azinho constituem expoentes máximos no contexto da Europa mediterrânica, constituem funções “não-produtivas” das florestas que a sociedade tem vindo a valorizar cada vez mais.
No quadro da luta contra as alterações climáticas, sem dúvida, o maior desafio ambiental que a Humanidade já enfrentou, as florestas desempenham um papel insubstituível como sumidouros de carbono. Esta foi uma das linhas de ação que emanou da Cimeira Mundial do Clima - o Acordo de Paris não só reconheceu a importância vital das florestas para o bem-estar global, como apela aos países para agirem na proteção dos recursos florestais, para travar a desflorestação e promover a gestão sustentável da floresta e o sequestro do carbono.
O problema da destruição das florestas pelos incêndios, que todos os anos são responsáveis por uma grande parte das emissões de dióxido de carbono e pela devastação dos sumidouros de carbono, é uma questão ambiental que deve ser acompanhada de perto pelo Governo e também pelos agentes do sector e pela Sociedade Civil.
Desse ponto de vista, a promoção da vitalidade dos ecossistemas florestais e a sua gestão profissional, assente em critérios de sustentabilidade, assumem um desafio cada vez mais necessário - diria mesmo, fundamental - para o futuro das florestas.
Em Portugal, os desafios da Economia Verde colocam a floresta num papel cimeiro e, num País onde mais de 95% das florestas são privadas, as políticas públicas assumem uma importância de ainda maior relevo. Neste domínio, os pagamentos silvo-ambientais e a fiscalidade verde constituem instrumentos de política que ganham actualidade crescente.
O Compromisso para o Crescimento Verde, lançando pelo anterior Governo, constituiu um primeiro passo, um marco nesse caminho, mas que importa agora dar seguimento e consequência, pois porque as políticas ambientais necessitam de um prazo longo de aplicação, tal como sucede na política florestal.
E, neste ponto, aqui retomo a mensagem da Agência Europeia do Ambiente relativa à importância da gestão sustentável dos espaços florestais para cumprir o papel decisivo que as florestas desempenham no desenvolvimento global e no combate às alterações climáticas.
Urge que as instâncias governamentais e a Sociedade Civil reconheçam e valorizem as florestas e os produtos florestais como importantes sumidouros de carbono. Nesta matéria, sublinho o Programa do Governo que inscreveu a valorização dos serviços silvo-ambientais prestados pelos espaços florestais (por ex., biodiversidade, conservação do solo e da água, sequestro de carbono) como uma linha de actuação num espetro mais amplo da intervenção para a mitigação das principais ameaças ambientais da atualidade - as alterações climáticas e a perda de biodiversidade.
É por tudo isso que o mundo (e Portugal) precisa de uma floresta mais verde, mais saudável e mais sustentável!

Miguel Galante(Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 272 (16.6.2016)

sábado, 21 de maio de 2016

Em defesa dos Sapadores Florestais

Há 3 anos atrás, neste espaço de opinião, questionava o futuro para o programa de Sapadores Florestais. É já no dia 21 de Maio que se celebra mais um “Dia Nacional do Sapador Florestal” e parece que o texto que recuperei do blog “o trilho da floresta”, onde guardo os textos que têm sido publicados na Gazeta Rural, mantem-se bastante actual.

Efetivamente, como defendi nessa altura, o programa de Sapadores Florestais constitui um dos alicerces do Sistema de Defesa da Floresta Contra Incêndios, nomeadamente em matéria de prevenção estrutural. E essa é uma constatação que tive a oportunidade de confirmar num conjunto de estudos de caso que realizei para um estudo maior de avaliação do programa de sapadores florestais[1].

Nesse conjunto de entrevistas, dos Baldios do Alto Minho ao coração da Serra Algarvia, encontrei dois grandes denominadores comuns: (1) a relevância local da actividade desenvolvida pelas equipas de sapadores florestais tanto na prevenção dos incêndios como na vigilância e primeira intervenção em fogos nascente e no apoio ao combate aos incêndios florestais e (2) as preocupações com o futuro (leia-se sustentabilidade financeira) do programa de sapadores florestais, por parte das entidades gestoras das equipas entrevistadas.

Os Sapadores florestais desempenham um papel relevante no ataque aos fogos nascentes

O decreto-lei que estabeleceu o regulamento jurídico da criação e funcionamento das equipas de Sapadores Florestais foi publicado há mais de 15 anos. Foi em 21 de maio de 1999, que a publicação desse diploma estabelecia o marco inicial do programa nacional de sapadores florestais, dando assim cumprimento a uma das ações prioritárias inscritas na Lei de Bases da Politica Florestal, que em Agosto deste ano celebra 20 anos de existência. Um marco que ficou consagrado com a comemoração do “Dia Nacional do Sapador Florestal”.

As equipas de sapadores florestais, constituídas por profissionais especializados, formados e qualificados para a realização de atividades de silvicultura preventiva e com capacidade de intervenção rápida em focos de incêndio nascentes, têm desempenhado ao longo destes anos uma ação importante na protecção dos recursos florestais.

Pese embora a grande maioria das equipas de sapadores florestais tenham as associações florestais como entidade gestora, também existe um conjunto significativo de equipas integradas em autarquias e nos órgãos de administração de baldios, traduzindo-se numa realidade bastante diversificada de casos que retratam a multiplicidade dos agentes florestais em Portugal.

Tal como escrevi na altura, comprovei no terreno que os impactos do programa de sapadores florestais vão muito para além da intervenção na floresta. São centenas de mulheres e de homens que têm na floresta o seu posto de trabalho e que contribuem, de uma forma insubstituível, para a sensibilização e informação das populações e dos proprietários florestais sobre as boas práticas de silvicultura e de protecção da floresta.

No entanto, este programa do Ministério da Agricultura está a deparar-se com muitas dificuldades na sua continuidade, determinadas, sobretudo, pelas dificuldades de financiamento. Recentemente, a bancada do Bloco de Esquerda no Parlamento questionou o Governo sobre os atrasos por parte do ICNF no pagamento às entidades gestoras das comparticipações relativas ao final de 2015, alertando para casos de “asfixia financeira”, sem conseguirem pagar salários, nem assegurar os materiais e combustíveis necessários à boa execução das tarefas que lhes estão acometidas.

É certo que a Ministra Cristas procedeu a um investimento significativo no reequipamento das equipas de Sapadores Florestais. Todavia, como se veio a verificar, pese embora a relevância e necessidade desse investimento, na prática serviu, sobretudo, para dar suporte a um conjunto de cerimónias com fins eleitoralistas, sem que nada de estrutural fosse, efectivamente, implementado pelo anterior Governo relativamente a este programa.

Face ao exposto, julgo que a questão que coloquei em Maio de 2013 mantem toda a actualidade: Que futuro para as equipas de sapadores florestais? Sem um debate aprofundado do programa de sapadores florestais com as entidades gestoras e sem uma revisão profunda do modelo de funcionamento e de financiamento do programa, receio que no médio prazo se torne insustentável a sua continuidade.

Apesar do reconhecimento local do papel insubstituível dos Sapadores Florestais nas comunidades rurais, apesar da reconhecida importância que estes profissionais detêm na protecção dos recursos florestais, a falta de um rumo e, sobretudo, de determinação política para a estruturação do programa de Sapadores Florestais pode deitar por terra todo o investimento já realizado.

Ainda, assim, creio que há uma luz ao fundo do túnel. Hoje, tal como em 1999, quando nasceu o programa de Sapadores Florestais, Capoulas Santos tem a Tutela das Florestas no Governo. É um político experiente, conhecedor da realidade do país real e da valia dos sapadores florestais para a protecção da floresta. Além disso, “rever e melhorar o Programa de Sapadores Florestais” constitui uma das linhas programáticas do atual Governo. Aguardemos, pois, pelos desenvolvimentos deste dossier a partir do Terreiro do Paço.

Miguel Galante
(Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 270 (13.5.2016)




[1] O estudo foi realizado pelo IESE (Instituto de Estudos Sociais e Económicos) para o ICNF em 2014/15.

terça-feira, 19 de abril de 2016

António Costa quer uma floresta à prova de fogo

O Primeiro-Ministro António Costa esteve em Mação, onde presidiu às comemorações oficiais do Dia Internacional das Florestas. “Roubei” o título da peça da TSF sobre essa jornada pela forma perfeita como sintetizou o discurso feito na ocasião por António Costa, com base na experiência vivida na primeira pessoa quando vivenciou a tragédia dos incêndios devastadores do verão de 2005, quando era Ministro de Estado e da Administração Interna.

António Costa, acompanhado do Ministro da Agricultura, Capoulas Santos, no Dia Internacional das Florestas

“Uma floresta à prova de fogo” representa uma visão política assente em espaço florestais ordenados, geridos de forma profissional e que visam aumentar a sua resiliência ao fogo (e a outras ameaças, tais como as pragas e as doenças) e, simultaneamente, gerarem riqueza aos seus proprietários e ao País.

De facto, Mação foi uma boa escolha para falar de floresta. Trata-se de um território que tem sofrido bastante com os incêndios florestais e que não baixou os braços. Logo após os grandes incêndios de 2003 que dizimaram quase toda a floresta desse concelho, o concelho de Mação foi pioneiro a apresentar a solução da gestão integrada do microfundio florestal em que assentava a mancha de pinhal, ou seja, aquilo que viria a ser consagrado nas Zonas de Intervenção Florestal. Mais tarde, em 2010, foi em Mação que se realizou o primeiro Encontro Nacional de Entidades Gestoras de Zonas de Intervenção Florestal.

De acordo com a informação disponível no ICNF, estão formalmente constituídas 178 ZIF, que abrangem cerca de 920.000 hectares, encontrando-se em preparação mais 33 ZIF que cobrem uma área superior a 280.000 hectares. Ou seja, se tudo correr bem, durante 2016 mais de um milhão de hectares estarão integrados em ZIF.

E esta é uma dimensão de território florestal que não pode ser ignorada pelo poder político. Também por isso foi importante a mensagem política que António Costa deixou em Mação no dia 21 de março, de valorização da importância do trabalho de “intervenção estrutural” na floresta. E neste domínio, as ZIF podem assumir um papel central.

Apesar da robustez destes números, a realidade no terreno evidencia que as ZIF ainda são “gigantes com pés de barro”, ou seja, os problemas e condicionalismos para a sua operacionalização mantêm-se quase inalterados, 5 anos depois do encontro nacional de Mação. Os números do ProDeR são esclarecedores das dificuldades das ZIF na mobilização dos fundos comunitários para o investimento na beneficiação dos povoamentos florestais ou na realização de novas arborizações, o que contrasta com a elevada capacidade de absorção dos dinheiros públicos para as intervenções na Defesa da Floresta Contra Incêndios, ou para o combate às pragas e doenças… mas neste caso trataram-se de projectos financiados a 100%.

Mas de Mação veio um outro sinal político importante. O Ministro da Agricultura, Capoulas Santos, reforçou a meta já anunciada pelo Governo de recuperação de 150 mil hectares de floresta numa década, com ênfase para o aproveitamento da regeneração natural de pinheiro bravo. E também neste desiderato as ZIF podem assumir um papel relevante, diria mesmo, decisivo.

O anterior Governo introduziu um conjunto de alterações legislativas no Decreto-lei n.º 27/2014, de 18 de fevereiro, que consagraram a existência legal das “ZIF de administração total”, em que a Entidade Gestora fica habilitada a proceder à administração integrada de todas as componentes do sistema agro-silvopastoril inserido na ZIF. No entanto, apesar dessa “agilização legislativa”, a verdade é que nos territórios onde prevalece a pequena propriedade as ZIF continuam sem conseguir ter uma implementação eficaz.

Na prática, subsiste a necessidade por todos identificada aquando do Encontro Nacional de 2010 “da existência de instrumentos financeiros que permitam às ZIF contornar a descapitalização da generalidade dos proprietários florestais aderentes” e, em certa medida, era essa a expectativa do setor em torno do Dia Internacional das Florestas, a expectativa do Governo anunciar a estratégia de desenvolvimento para as Zonas de Intervenção Florestal.

"Hoje, temos um sistema de prevenção mais robusto. Hoje, temos um sistema de combate mais robusto. Mas aquilo que temos de ter, sobretudo, é uma floresta mais robusta, mais resiliente ao fogo e por isso mais suscetível de criar riqueza", afirmou, convicto, António Costa e eu assino por baixo, mas para que essa visão se torne realidade são precisas medidas concretas de política florestal que tardam a aparecer dos lados do Terreiro do Paço. E, desse ponto de vista, em Mação perdeu-se uma boa oportunidade para relançar as ZIF na agenda política e combater o absentismo e o desinvestimento na floresta…

Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 268 (15.4.2016)

quarta-feira, 16 de março de 2016

A floresta, uma atividade económica com futuro

O Banco de Portugal apresentou no final de Janeiro um estudo em que analisa a situação económica e financeira das empresas dos Setores da Madeira, da Cortiça e do Papel no período 2010-2015, e que merece um olhar atento sobre um setor da actividade económica que no final do 1.º semestre de 2015 era o quinto principal setor exportador da nossa economia e representava 7,9% das exportações de bens.

Moeda comemorativa da Presidência Portuguesa da União Europeia de 2007.
A face nacional contém, ao centro, a representação do sobreiro, simbolizando uma das maiores fontes de riqueza nacional. (fonte: INCM)


Trata-se de uma análise setorial que surge num momento oportuno, de início de um novo ciclo político e que deve olhar para a floresta como um setor estratégico para a revitalização da economia nacional. O estudo do Banco de Portugal, ainda que de forma bastante sintética, apresenta um retrato objetivo da actividade económica empresarial do setor e permite uma visão clara das quatro componentes principais que o compõem: as empresas de silvicultura, a montante, e a jusante o segmento transformador da Madeira e Mobiliário, da Cortiça e do Papel.

Numa primeira leitura, evidencia-se a recuperação da crise económica internacional que afetou o setor em 2008-2010 e que fruto de um conjunto de medidas tomadas na altura (recordo o Plano de Apoio à Industria da Cortiça de 2009, que constituiu a alavanca para o setor enfrentar a crise), hoje apresenta-se em ascensão, como sublinha João Ferreira do Amaral, Presidente da Associação das Industrias da Fileira Florestal (AIFF). Os números da actividade económica falam por si: o volume de negócios dos setores da madeira, cortiça e papel cresceu cerca de 5% em 2015, mais 3% do que o conjunto das empresas nacionais.

Apesar das boas notícias, uma leitura mais fina do estudo aponta um conjunto de situações que importa ter em linha de conta na perspectiva do desenvolvimento sustentável do Setor Florestal em Portugal. Desde logo a natureza distintiva das características do tecido empresarial de cada segmento, com destaque para o conjunto de microempresas empresas de silvicultura (mais de 80% das empresas deste ramo), que operam muitas vezes sem respeito pelas condições de segurança do trabalho florestal e que podem condicionar, no médio prazo, a necessária aposta na certificação florestal da cadeia de valor. Este é um aspeto que realça ainda mais a urgência de regulamentação desta actividade, através da obrigatoriedade do “alvará florestal” que há anos é reivindicado pela ANEFA.
Na vertente industrial, os subsetores da Cortiça e do Papel revelam fileiras consolidadas, com estruturas bem definida e com empresas líderes de mercado, já no subsetor da Madeira e Mobiliário (a “fileira do pinho”), são muitos os problemas que subsistem.

Esta é uma nota importante, pois este subsetor congrega cerca de 60% do emprego e das empresas que laboram no Setor Florestal, assente num tecido empresarial onde as PME assumem um peso relevante (os gastos com pessoal registam o maior peso relativo dos 4 subsetores, com 20%) e com maior concentração nos distritos de Coimbra e Castelo Branco, territórios de interior, onde o emprego é um fator critico para a fixação de população.

Em 2014, segundo o estudo em análise, o rácio de autonomia financeira das empresas do subsetor da Madeira e Mobiliário cifrava-se em 33%, o que implica uma dependência de capital alheio e passivos preocupantes e que contribuem para um elevado nível de pressão financeira que pode condicionar no médio-longo prazo a sustentabilidade desta fileira, que era era apontada no famoso Relatório Porter, de 1992, como um dos clusters (produtos florestais) em que Portugal apresentava uma vantagem competitiva.

Não obstante o investimento realizado neste subsetor na inovação tecnológica e no design e que tem permitido um registo interessante nos mercados externos e o desenvolvimento da indústria do mobiliário na “capital do móvel” (Paredes e Paços de Ferreira), a montante, a indústria de serração e a silvicultura do pinho continuam a definhar.

Ainda recentemente, em Vouzela, o Secretário de Estado das Florestas sinalizou a persistência das debilidades na gestão da floresta, nomeadamente no pinhal, que contribui para que sejam criadas condições para a propagação de incêndios e para a proliferação de problemas fitossanitárias, com natural destaque para o Nemátodo da Madeira do Pinheiro.

Apesar de todas estas fragilidades, a fileira floresta-madeira-móvel constitui um setor em que Portugal deve apostar. O programa do Governo aponta o reforço do ordenamento florestal e da produtividade das principais fileiras silvo-industriais, o apoio à melhoria das organizações de produtores e da gestão interprofissional como linhas orientadoras para o desenvolvimento do Setor Florestal.

E é nesse sentido que termino com palavras do Presidente da AIFF, que corroboro: “Existe grande capacidade empresarial e de inovação no setor florestal. Há condições para manter e até desenvolver estas capacidades. O ponto essencial é que a produção florestal consiga ter as condições para corresponder com mais e melhor madeira e mais e melhor cortiça”.

A floresta está na base de uma actividade económica que em 2014 representava cerca de sete mil empresas (2% das empresas portuguesas) e geria 3% do volume de negócios e de número de pessoas empregadas em Portugal. No entanto, faltam as medidas concretas para concretizar a floresta como um recurso económico com futuro aos seus proprietários, para atrair investimento e gerar mais riqueza. Veremos que anúncios o Governo fará por ocasião das comemorações do Dia Internacional das Florestas, pois está na hora de passar das palavras à ação!

Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 266 (16.3.2016)

domingo, 28 de fevereiro de 2016

PDR 2020, um instrumento de apoio à recuperação da floresta?

Amândio Torres, Secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, anunciou há dias, na primeira reunião do Conselho Florestal Nacional, o objectivo do Governo de recuperar 150 mil hectares de floresta no prazo de duas legislaturas. Ainda que apresentado de uma forma vaga, este é um objectivo importante, sobretudo quando o ultimo inventário florestal nacional reporta a regressão da área florestal em Portugal e sinaliza a degradação da floresta existente.

Para concretizar esta desejável reabilitação da floresta, importa recorrer aos fundos comunitários para estimular o investimento na gestão florestal e também em novas arborizações. Na programação do PDR 2020 foram canalizados cerca de 540 milhões de euros de financiamento público para o sector florestal, representando 13% dos fundos europeus desse programa operacional e um aumento do envelope financeiro superior a 10% comparativamente ao ProDeR. Trata-se, portanto, de uma verba significativa que pode (e deve) contribuir, de forma relevante, para alavancar o investimento produtivo na floresta.


No entanto, conforme alertou recentemente a ANEFA em comunicado, uma parte significativa dessa verba já está comprometida. Os próprios documentos da Autoridade de Gestão do PDR 2020 são claros quanto aos valores já comprometidos no período de transição – 215 milhões de euros, ou seja, quase metade da verba destinada ao apoio do setor florestal.

Contudo, uma leitura com maior profundidade evidencia um problema maior, ou seja, mais de 212 milhões de euros estão comprometidos com os apoios destinados à Medida 8 “Proteção e reabilitação de povoamentos florestais”, onde se inscrevem as linhas de apoio ao investimento na gestão activa da floresta, mas também o financiamento da protecção da floresta contra os incêndios e contra os agentes bióticos. Esta situação levanta um sério problema de capacidade efectiva de realização de investimento privado na gestão florestal, pois verifica-se que cerca de metade da verba destinada para esta Medida transitou comprometida nas linhas destinadas à protecção florestal quando ainda não chegámos a meio do período de execução do PDR 2020. Aliás, impunha-se que a Autoridade de Gestão do PDR 2020 publicasse, de forma sistemática, informação atualizada da verba comprometida e das verbas ainda disponíveis nas várias linhas de apoio.

Ainda tendo presente os objectivos apresentados pelo Secretário de Estado das Florestas, existe um outro aspeto que importa ter em linha de conta – o desinteresse na realização de novas arborizações. Na vigência do ProDeR, segundo dados oficiais, pouco mais de 16.000 hectares foram florestados com recurso aos apoios comunitários, o que revela uma perda muito significativa da dinâmica de florestação registada no âmbito do Reg. (CEE) n.º 2080/92. É muito pouco, diria mesmo, demasiado pouco para um setor da actividade económica que tem uma indústria de base florestal forte, geradora de riqueza para o País e com capacidade de produção instalada, mas que se vê confrontada com um deficit de crescente matéria-prima nacional para laborar.

De igual modo, importa perceber se o actual Governo vai manter inalterado o regulamento do Fundo Florestal Permanente. Nos moldes em que foi desenhado pelo anterior Governo em pouco contribuía para um apoio efectivo da floresta portuguesa, permitindo até canalizar verbas para “financiar” a comparticipação nacional dos apoios públicos das Medidas Florestais do PDR 2020, contrariando os propósitos que estiveram subjacentes à criação deste fundo de financiamento do setor florestal inscritos na Lei de Bases da Política Florestal e no diploma que o criou em 2004.

Em suma, quando o Governo assume uma aposta forte nas principais fileiras florestais seria importante que a evolução recente do setor e os problemas estruturais que continuam a condicionar o desenvolvimento da floresta portuguesa, associado ao longo retorno do investimento realizado, fossem bem ponderados antes de apontar publicamente metas concretas. Embora ambiciosa, considero que a meta anunciada é desejável e exequível no prazo apontado.

Competirá agora ao actual Governo ter o engenho e a vontade política necessárias para encetar a apregoada “Reforma estrutural do setor florestal” e para dotar o PDR 2020 de capacidade efectiva de apoiar essa reforma, reprogramando as verbas associadas às Medidas Florestais se necessário.

O PDR 2020 (e em certa medida também o Fundo Florestal Permanente) deve constituir um instrumento central no financiamento da política florestal em Portugal. Nessa perspetiva, era importante que em 2016 fossem dados claros sinais políticos nesse sentido, criando a necessária base de confiança para quem pretender investir na floresta em Portugal.

Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 264 (15.2.2016)

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Um novo ciclo para a floresta em Portugal

O XXI Governo Constitucional, liderado por António Costa, reinscreveu a Secretaria de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural no elenco governativo. Extinta em Outubro de 2014, durante o consulado de Assunção Cristas no Ministério da Agricultura, a floresta está de volta à agenda política e em boa hora!


Esta é uma boa notícia para o sector florestal, que tem a chefiar a equipa ministerial da Agricultura um político com currículo, com provas dadas em Portugal e em Bruxelas. Capoulas Santos configura, no contexto político atual, uma escolha que garante estabilidade e confiança junto dos agentes do setor e que deixa esperança no lançamento de um novo ciclo na política florestal em Portugal.
António Costa havia afirmado em março, na celebração do Dia Internacional da Floresta, que Portugal precisa de uma “Reforma Estrutural do Setor Florestal”. Pois bem, é esse compromisso que encontramos nas linhas orientadoras do Programa de Governo, em que a floresta assume protagonismo na perspectiva da valorização do território nacional.
Nesse quadro, a valorização dos recursos florestais, cujas orientações fundamentais compreendem o reforço do ordenamento florestal e da produtividade das principais fileiras silvo-industriais, o apoio à melhoria das organizações de produtores e da gestão interprofissional, bem como a primazia da protecção da floresta face aos incêndios e aos agentes bióticos nocivos, a dinamização ambiental e económica dos espaços florestais sob a gestão do Estado, o estímulo para a certificação dos processos produtivos e a promoção da floresta de uso múltiplo (nomeadamente dos sistemas agrossilvopastoris e da floresta de montanha), são linhas de força da ação governativa para o Setor Florestal inscritas no Programa do XXI Governo Constitucional.
Perante tal premissa, são muitos e complexos os desafios que esperam a equipa de Capoulas Santos, depois de 4 anos sem um rumo definido para a política florestal – revitalizar a Administração Florestal, desbloquear o Cadastro Florestal, rever os PROF, fomentar as ZIF e o movimento associativo florestal, investir nos Baldios, promover a certificação florestal e robustecer a fileira florestal constituem, assim, desafios estruturantes para o futuro do setor florestal em Portugal.
Também a operacionalização dos incentivos financeiros do PDR 2020 e do Fundo Florestal Permanente constitui um desafio exigente e, por ventura, este será a primeira “prova de fogo” do Ministério de Capoulas Santos.
Uma palavra final para Amândio Torres: um engenheiro silvicultor conhecedor do setor e da administração florestal, é o novo titular da Pasta das Florestas no Governo Socialista. Fruto do seu percurso profissional e político, é uma pessoa capaz de ir ao cerne das questões florestais e de ser bem sucedido nessa demanda de concretizar a Reforma do Setor Florestal, a bem da afirmação do potencial do principal recurso natural renovável do nosso Pais, a FLORESTA!

Miguel Galante
(Eng. Florestal)

Gazeta Rural, edição n.º 261 (17.12.2015)