quarta-feira, 2 de abril de 2014

O futuro da floresta em Portugal

Em meados de Fevereiro a Fundação Francisco Manuel dos Santos publicou um ensaio da autoria do Professor João Santos Pereira do Instituto Superior de Agronomia, que serviu de mote e inspiração para este texto de opinião. Um livro que serviu de base ao debate promovido pela Sociedade Portuguesa de Ciências Florestais no Dia Internacional da Floresta.

Trata-se de uma obra que ao longo de 92 páginas, apresenta uma caracterização da floresta e do sector florestal em Portugal e dos principais conceitos inerentes à silvicultura e que termina com um capítulo subordinado aos desafios do futuro e às políticas florestais.


É sabido que a floresta tem um elevado valor económico, social e ambiental e, sobretudo, cria riqueza que se materializa no elevado volume de exportações das industrias de base florestal, com saldo amplamente positivo na balança comercial portuguesa. E, como o Presidente da República fez questão de assinalar por ocasião da celebração do Dia Internacional da Floresta, 21 de Março, “é da maior importância sensibilizar os portugueses para a defesa, a protecção e a valorização da nossa floresta”.

Mas, que futuro está reservado para a floresta em Portugal? Uma floresta que está nas mãos de privados e que no espaço de 100 anos passou de uma ocupação residual para ocupar mais de um terço do território e que tem revelado grande dinamismo assente sobretudo no eucalipto, o principal produto florestal em termos de valor de produção e que assume cada vez maior importância económica. O autor da obra supracitada elenca quatro eixos fundamentais para a política florestal em Portugal: a defesa da floresta contra incêndios, a florestação/reflorestação, a protecção contra pragas e doenças e a adaptação às alterações climáticas.

Numa análise atenta é fácil perceber que os riscos que pendem sobre o futuro da floresta são complexos e exigem uma intervenção bastante articulada entre o Estado/Administração Central e os privados, detentores de cerca de 98 por cento da floresta em Portugal. Uma articulação que pode ser estruturada com base no estabelecimento de contratos-programa plurianuais com as organizações de produtores florestais e que permitam a operacionalização no terreno, junto dos proprietários e produtores florestais, das orientações de política florestal.

No entanto, verifica-se que o instrumento de política que deveria estabelecer a visão e as orientações estratégicas – a nova Estratégia Nacional para as Florestas, tarda em surgir, correndo o risco de não ter capacidade de influenciar o principal mecanismo de financiamento público da floresta portuguesa nos próximos anos, o Programa de Desenvolvimento Rural 2014-2020.

O PDR 2020 apresenta os apoios destinados ao sector florestal em duas Medidas – M4. Valorização dos recursos florestais e M8. Protecção e reabilitação de povoamentos florestais, onde se incluem os apoios para a melhoria do valor económico das florestas e que contemplam a elegibilidade dos custos inerentes ao processo de certificação florestal.

Tal como o Prof. João Santos Pereira identifica, são muitos os desafios que se colocam à floresta e ao sector florestal em Portugal e que tem na mitigação do risco dos incêndios florestais “o principal factor limitante para o investimento na floresta”. Mas outros desafios carecem de medidas que devem ser inscritas numa política florestal sólida na visão de longo prazo, estável do ponto de vista institucional e de “geometria variável”, ou seja, com a amplitude e flexibilidade necessária para dar resposta às várias realidades e multifuncionalidades das florestas que compõem o coberto nacional.

A produtividade da atividade florestal não tem evidenciado uma evolução positiva, para o que têm contribuído os incêndios e danos causados por agentes bióticos nocivos cujos efeitos se têm vindo a agravar com as alterações climáticas. Do meu ponto de vista é aqui que reside o maior desafio de todos – o combate à negligência e ao abandono florestal através da gestão activa e profissional da floresta, ou seja, tornar a floresta um activo rentável e que vale a pena investir!

Existe potencial para afirmar a floresta enquanto um recurso endógeno estratégico para o País quer como produtor de bens transaccionáveis, quer como um pilar da sustentabilidade ambiental do território. É preciso olhar para o futuro, estar bem ciente dos impactos dos cenários das alterações climáticas e procurar novas soluções tendo presente o contributo da floresta e do sector florestal para a Economia Verde, nomeadamente em matéria da utilização eficiente e sustentável dos recursos florestais, da produção de energias renováveis e da valorização das amenidades geradas nos ecossistemas florestais através do pagamento dos serviços silvoambientais prestados à Sociedade.

Miguel Galante
(Eng. Florestal)

Gazeta Rural, edição n.º 221 (28.03.2014)