sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Mais e melhor floresta!

O mês que agora finda voltou a colocar a floresta no centro das atenções dos portugueses. O grande incêndio ocorrido em Trás-os-Montes voltou a demonstrar as fragilidades do nosso território rural (e dos meios de combate) face à principal ameaça para a sustentabilidade da floresta portuguesa – os incêndios florestais!

Este incêndio percorreu cerca de 15.000 hectares de povoamentos florestais, áreas de matos e terrenos agrícolas, causando prejuizos estimados em 3 a 4 milhões de euros só na agricultura. Destruição de alimentação para animais e animais mortos, destruição de olivais, amendoais, vinha, pomares, pastagens (além de fardos) e apiários e equipamentos e infraestruturas agrícolas, como maquinaria e sistemas de rega foram os principais prejuízos contabilizados na área agrícola pela DRAP Norte.

A Mata Nacional de Leiria, a joia da coroa da silvicultura portuguesa
Também no final de Julho foi publicada a legislação que irá regulamentar o licenciamento de novas arborizações e rearborizações, um diploma que ainda há um ano esteve envolto em grande polémica. Do que li, parece-me que a solução encontrada incorpora um conjunto de reflexões e contributos que resultaram do processo de consulta pública, dotando-o de maior assertividade. Parece-me, pois, que este diploma estabelece uma boa relação de compromisso e uma vez implementado, poderá resultar num instrumento útil para a normalização da floresta privada nacional, um aspecto cada vez mais exigido para o controlo da origem da madeira, conferindo maior transparência ao mercado madeireiro no cumprimento das exigências comunitárias da circulação de madeira.

Na sequência da publicação deste diploma, as principais associações ambientalistas pediram que o Parlamento procedesse à sua análise, o que me parece ser uma proposta sensata, pois trata-se de um instrumento regulador que irá ter impactos na dinâmica de evolução da floresta nacional, uma floresta em mudança como bem evidenciaram os números preliminares do último inventário florestal nacional.

De facto, 2013 promete trazer novidades para a política florestal nacional. No final de Junho, a Comissão de Agricultura da Assembleia da Republica procedeu a uma audição pública para discussão do estudo de avaliação da implementação da Estratégia Nacional para as Florestas (ENF). Foi uma sessão bastante participada, que proporcionou um um conjunto de reflexões pertinentes dos principais agentes do sector e que demonstra a importância do sector florestal para o País.

Tendo tido a oportunidade de integrar a Equipa Técnica que desenvolveu esse Estudo, posso afirmar que estão reunidas as condições necessárias para iniciar um novo ciclo na política florestal nacional, passados quase 17 anos da aprovação por unanimidade da Lei de Bases da Política Florestal.

Atendendo aos desafios cada vez mais exigentes que se colocam ao sector florestal e assente na necessidade de estabelecer uma visão de longo prazo que oriente as actuações conducentes ao desenvolvimento sustentável do sector, julgo que estão reunidas as condições de base necessárias para a formulação de um verdadeiro programa florestal nacional, que tendo como ponto de partida a revisão em curso da ENF permita estabelecer um conjunto de programa de acção sectoriais de curto/médio prazo no horizonte de 2020 e que permita servir de suporte para a mobilização dos recursos financeiros do próximo programa de desenvolvimento rural.

Conforme foi destacado num suplemento recentemente publicado no Diário Económico, “a floresta portuguesa é mais um dos tesouros nacionais ainda mal explorados”, que importa rentabilizar e desenvolver numa perspectiva sustentável e de longo prazo. Entretanto, recentemente o País esteve suspenso numa crise política, que cessou com mais uma remodelação governamental que voltou a separar, após dois anos de “união de facto”, o Ministério da Agricultura do Ministério do Ambiente. Subsiste uma dúvida: com a criação da Sec. Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza no Ministério do Ambiente, em que Tutela fica o ICNF?

No meu ponto de vista, a floresta portuguesa, assente numa floresta privada de cariz essencialmente produtivo, necessita de uma Administração Florestal dialogante com os agentes do sector, dotada de capacidade técnica e de presença no terreno e com autonomia financeira para assegurar uma boa gestão dos territórios florestais a seu cargo. Assim, será possível ter um futuro com mais e melhor floresta em Portugal.

Termino com uma palavra de felicitação para o amigo José Luis Araujo pelo 9.º aniversário da Gazeta Rural. Acompanho há já alguns anos o trabalho desenvolvido na melhoria continua da informação que, quinzenalmente, publica na Gazeta Rural. Deixo os meus votos de sucesso para que daqui por um ano possamos estar a celebrar uma década de informação de qualidade sobre o mundo rural.

Miguel Galante
(Eng. Florestal)

Gazeta Rural, edição n.º 206 (29.7.2013)