Terminou, recentemente, mais uma “Cimeira
do Clima” das Nações Unidas. Mais uma vez, foram apresentados vários estudos e relatórios
técnicos que evidenciam a mudança em curso do clima à escala global e os
impactes negativos socio-económicos e ambientais que lhe estão associados.
A ronda de Doha saldou-se por resultado
“magro” conseguido através da extensão do Protocolo de Quioto até 2020 para um conjunto
de países que representa cerca de 15% das emissões globais de CO2. Embora
seja um resultado positivo e que tem a marca da União Europeia, persiste uma
preocupante interrogação quanto ao futuro. Se por um lado parece existir
vontade em colocar o tema das Alterações Climáticas na agenda política (o
discurso do Presidente Obama na noite eleitoral é disso demonstrativo), por
outro lado a crise económica mundial (sobretudo, a crise do mundo ocidental) e
a pouca disponibilidade dos grandes emissores mundiais (China, EUA, Canadá) para
assumirem compromissos e metas concretas para reduzir as emissões de CO2,
condicionam o empenho que a União Europeia tem colocado neste dossier.
As áreas protegidas nos espaços de montanha (Serra da Estrela) constituem um território de grande potencial para a valorização dos serviços ambientais dos ecossistemas florestais |
No plano europeu, existe uma
preocupação efectiva em promover o crescimento a partir de uma economia de
baixo teor de carbono, um desígnio para o qual o sector florestal detém um
papel importante. A concretização da estratégia europeia de crescimento
económico “Europa 2020”, assente
numa gestão mais eficiente dos recursos, promotora da competitividade e que
valoriza a bioeconomia (Economia Verde), tem no sector florestal um importante
pilar no desenvolvimento rural e regional, nomeadamente ao nível da criação de
emprego e no fornecimento de vários serviços indispensáveis ao bem-estar das
populações rurais e urbanas.
A floresta assume, portanto, um
papel central nas estratégias de mitigação das Alterações Climáticas. Todavia, no
cenário do aumento da frequência e severidade das secas em consequência do
aquecimento global, as florestas na região mediterrânica tenderão a passar de
sumidouros para emissores de CO2 e as perdas de produtividade e de
biodiversidade serão muito elevadas. Como, oportunamente, lembrou Filipe Duarte
Santos, investigador da Faculdade de Ciências que estuda as alterações
climáticas e os seus impactos em Portugal, esta situação terá contornos
dramáticos, dada a vulnerabilidade das nossas florestas às secas e aos fogos.
Estima-se que a floresta portuguesa
garante o sequestro de cerca de 280 milhões de toneladas de CO2,
segundo os dados do 5.º Inventário Florestal Nacional (2005/06). Trata-se de um
registo importante, que assegura o cumprimento por Portugal dos compromissos
assumidos no Protocolo de Quioto. Todavia, este serviço ambiental das florestas
não é remunerado aos seus proprietários.
O pagamento dos serviços
ambientais é um assunto que tem merecido uma atenção crescente nos debates
nacionais e internacionais sobre política florestal. Em Novembro último, na
Conferência Internacional “Floresta e Sociedade”, organizada pela FORESTIS, foi
várias vezes sublinhado que o pagamento dos serviços ambientais prestado pelas
florestas, nomeadamente no sequestro do CO2, deverá constituir, no
futuro, uma importante mais-valia para os proprietários florestais (sobretudo,
se estiver associado a uma gestão florestal profissional e sustentável).
Assim, numa perspectiva de
valorização da “Economia Verde”, uma visão de futuro que releva o papel
multifuncional das florestas, nomeadamente dos serviços públicos prestados
pelos ecossistemas florestais na preservação do solo, na retenção do carbono,
na regularização do regime hidrológico e da qualidade da água, na conservação
da biodiversidade e na promoção e salvaguarda das paisagens naturais/rurais, o debate
em torno do papel da floresta na transição para uma Economia Verde deverá
contemplar necessariamente a reflexão sobre o desenvolvimento de mecanismos de
remuneração dos serviços do ecossistema.
A valorização do papel da
floresta nesse prisma deve, assim, constituir um dos pilares da Estratégia
Nacional para as Florestas e uma das “ideias de força” na preparação do próximo
período de programação financeira comunitária. Também, importará avaliar a forma
como o pagamento dos serviços dos ecossistemas florestais se pode enquadrar nos
fundos públicos nacionais, quer no Fundo Florestal Permanente, quer nos Fundos
do Carbono, da Biodiversidade e da protecção dos recursos hídricos.
E, nessa perspectiva, estou
convicto que o pagamento das externalidades positivas das florestas aos seus
proprietários irá constituir uma oportunidade para a captação de investimento
(público e privado), com o objectivo de intervir nos espaços florestais quer ao
nível da gestão/manutenção quer ao nível da recuperação dos ecossistemas florestais.
Como salienta a FAO, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura, o investimento na florestação e na manutenção dos serviços do
ecossistema deve ser uma das linhas estratégicas para um futuro mais sustentável.
Miguel Galante
(Eng. Florestal)
(Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 192 (14.12.2012)