Escrevo estas linhas no regresso de uns dias de férias na
Europa Central, longe das notícias do fogo que consome a floresta portuguesa,
mas que marcaram o verão em Portugal lá fora. No norte da Alemanha não arde, as
florestas crescem em regimes culturais de ciclo longo, com cortes finais aos
60, 80 e até 100 anos nalguns casos. A nossa floresta produtora de material
lenhoso é bastante diferente e actualmente nalgumas regiões do País já nem é
possível assegurar um ciclo de 20 anos sem fogo, como ficou demonstrado este
ano na zona do Pinhal Interior.
E é nesse contexto que o anúncio feito pelo Primeiro-Ministro
António Costa, em Oliveira do Hospital, da reactivação do Programa Sapadores
Florestais merece destaque e uma análise mais fina do seu potencial impacto.
Cerimónia de entrega de 20 novas eSF em Oliveira do Hospital |
Esta medida é mais uma evidência do empenho de António Costa
na valorização da floresta em Portugal. E não deixa de ser curioso que quase 20
anos depois de Capoulas Santos ter presidido à criação do Programa de Sapadores
Florestais em 1999 ser, novamente, sob a sua tutela que os Sapadores Florestais
voltam a ganhar protagonismo. Aliás, o primeiro sinal dessa vontade política já
havia sido dado no quadro da Reforma da Floresta, quando foi revisto o valor da
comparticipação do Estado no Serviço Público, traduzindo-se num aumento de 5
mil euros/ano das transferências de fundos para as entidades gestoras dessas
equipas.
É certo que a tarefa a que o Governo se propõe de criar 200
novas equipas de Sapadores Florestais até ao final da legislatura (conforme
exigiu o Parlamento) não será fácil, mas é fundamental para o Pais e aqui não
posso deixar de assinalar a oportunidade desperdiçada pelo anterior Governo
para proceder à reactivação deste programa, tendo por base o estudo de
avaliação que foi então realizado.
Não obstante todo o empenho político de António Costa e
Capoulas Santos, segue-se o mais difícil – reestruturar o programa para assumir
um novo patamar de desempenho e encontrar a respectiva fonte de financiamento
público, que permita enquadrar as novas equipas sem descurar a manutenção das
existentes, algumas em funcionamento desde o seu início em Maio de 1999. E esse
é um desafio da maior importância para o novo titular da pasta das Florestas,
pois este programa encontra-se claramente subvalorizado no quadro atual do
ICNF.
Esta é uma oportunidade impar para atender ao enquadramento
da natureza especifica das entidades gestoras e assegurar o necessário
acompanhamento técnico, bem como para preparar um robusto programa de formação
profissional que permita concretizar o estatuto profissional do sapador
florestal.
No que respeita à questão do financiamento, uma questão
central para o sucesso desta medida, a solução encontrada em 2009, ancorada no
Fundo Florestal Permanente terá de ser revista, pois a manutenção deste modelo
de financiamento tornar-se-á insustentável a prazo. Atualmente, das verbas
anuais de 20 milhões de euros angariadas pelo Estado na ecotaxa aplicada sobre
os combustíveis, cerca de metade é desde logo canalizada para o Programa de
Sapadores Florestais.
A reactivação do Programa de Sapadores Florestais é um
investimento de futuro, estratégico na política de defesa da floresta contra
incêndios. As 500 equipas de sapadores florestais vão constituir um corpo de profissionais
qualificados, que operam no terreno 365 dias por ano e que vão desenvolver uma
ação relevante quer na gestão dos combustíveis florestais, quer na
sensibilização e informação das populações como durante as acções de combate e
sem esquecer o papel que poderão deter na implementação do programa de fogo
controlado.
É certo que os Sapadores Florestais por si só não são uma
panaceia para o problema dos incêndios florestais em Portugal, mas devidamente suportados
num programa robusto e em estreita articulação com os demais agentes que operam
no terreno, poderão dar um contributo útil e válido para a protecção das
florestas e dos espaços rurais. Assim haja capacidade para aproveitar e
materializar esta oportunidade!
Miguel Galante
(publicado online no site da Gazeta Rural em 30.8.2017)
PS: Uma nota final para o anúncio feito pelo Secretário de
Estado das Florestas Miguel Freitas da criação de uma equipa de Sapadores
Florestais na Mata Nacional do Bussaco. Esta é uma boa notícia para reforçar a
capacidade de protecção do valioso património florestal ali existente.
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