segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O renascimento do Programa de Sapadores Florestais

Escrevo estas linhas no regresso de uns dias de férias na Europa Central, longe das notícias do fogo que consome a floresta portuguesa, mas que marcaram o verão em Portugal lá fora. No norte da Alemanha não arde, as florestas crescem em regimes culturais de ciclo longo, com cortes finais aos 60, 80 e até 100 anos nalguns casos. A nossa floresta produtora de material lenhoso é bastante diferente e actualmente nalgumas regiões do País já nem é possível assegurar um ciclo de 20 anos sem fogo, como ficou demonstrado este ano na zona do Pinhal Interior.

E é nesse contexto que o anúncio feito pelo Primeiro-Ministro António Costa, em Oliveira do Hospital, da reactivação do Programa Sapadores Florestais merece destaque e uma análise mais fina do seu potencial impacto.

Cerimónia de entrega de 20 novas eSF em Oliveira do Hospital

Esta medida é mais uma evidência do empenho de António Costa na valorização da floresta em Portugal. E não deixa de ser curioso que quase 20 anos depois de Capoulas Santos ter presidido à criação do Programa de Sapadores Florestais em 1999 ser, novamente, sob a sua tutela que os Sapadores Florestais voltam a ganhar protagonismo. Aliás, o primeiro sinal dessa vontade política já havia sido dado no quadro da Reforma da Floresta, quando foi revisto o valor da comparticipação do Estado no Serviço Público, traduzindo-se num aumento de 5 mil euros/ano das transferências de fundos para as entidades gestoras dessas equipas.

É certo que a tarefa a que o Governo se propõe de criar 200 novas equipas de Sapadores Florestais até ao final da legislatura (conforme exigiu o Parlamento) não será fácil, mas é fundamental para o Pais e aqui não posso deixar de assinalar a oportunidade desperdiçada pelo anterior Governo para proceder à reactivação deste programa, tendo por base o estudo de avaliação que foi então realizado.

Não obstante todo o empenho político de António Costa e Capoulas Santos, segue-se o mais difícil – reestruturar o programa para assumir um novo patamar de desempenho e encontrar a respectiva fonte de financiamento público, que permita enquadrar as novas equipas sem descurar a manutenção das existentes, algumas em funcionamento desde o seu início em Maio de 1999. E esse é um desafio da maior importância para o novo titular da pasta das Florestas, pois este programa encontra-se claramente subvalorizado no quadro atual do ICNF.

Esta é uma oportunidade impar para atender ao enquadramento da natureza especifica das entidades gestoras e assegurar o necessário acompanhamento técnico, bem como para preparar um robusto programa de formação profissional que permita concretizar o estatuto profissional do sapador florestal.

No que respeita à questão do financiamento, uma questão central para o sucesso desta medida, a solução encontrada em 2009, ancorada no Fundo Florestal Permanente terá de ser revista, pois a manutenção deste modelo de financiamento tornar-se-á insustentável a prazo. Atualmente, das verbas anuais de 20 milhões de euros angariadas pelo Estado na ecotaxa aplicada sobre os combustíveis, cerca de metade é desde logo canalizada para o Programa de Sapadores Florestais.

A reactivação do Programa de Sapadores Florestais é um investimento de futuro, estratégico na política de defesa da floresta contra incêndios. As 500 equipas de sapadores florestais vão constituir um corpo de profissionais qualificados, que operam no terreno 365 dias por ano e que vão desenvolver uma ação relevante quer na gestão dos combustíveis florestais, quer na sensibilização e informação das populações como durante as acções de combate e sem esquecer o papel que poderão deter na implementação do programa de fogo controlado.

É certo que os Sapadores Florestais por si só não são uma panaceia para o problema dos incêndios florestais em Portugal, mas devidamente suportados num programa robusto e em estreita articulação com os demais agentes que operam no terreno, poderão dar um contributo útil e válido para a protecção das florestas e dos espaços rurais. Assim haja capacidade para aproveitar e materializar esta oportunidade!

Miguel Galante
(publicado online no site da Gazeta Rural em 30.8.2017)


PS: Uma nota final para o anúncio feito pelo Secretário de Estado das Florestas Miguel Freitas da criação de uma equipa de Sapadores Florestais na Mata Nacional do Bussaco. Esta é uma boa notícia para reforçar a capacidade de protecção do valioso património florestal ali existente.

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