20 anos volvidos sobre a aprovação na Assembleia da
República da Lei de Bases da Política Florestal, importa deitar um olhar
critico ao estado em que se encontra hoje a floresta portuguesa. Uns verão o
“copo meio cheio”, com mais planeamento, com uma industria de base florestal
consolidada, exportadora de bens transaccionáveis e que gera riqueza para o
País, outros, pelo contrário, verão o “copo meio vazio”, da floresta devastada
por incêndios cada vez mais devastadores e pelo abandono a que tem sido votada,
em resultado da perda crescente de rentabilidade, conjugado com o aumento
crescente dos riscos a que está sujeita.
Eu olho para trás e vejo, sobretudo, 20 anos de oportunidades
perdidas, resultantes da deriva a que a política florestal tem estado sujeita. E
o ano que passou espelha bem as consequências dessa deriva. A floresta voltou a
ser o pasto das chamas, em mais um Agosto em que os incêndios fizeram a
abertura dos telejornais e geraram infindáveis debates sobre a teorização
desses mesmos incêndios. E, novamente, das cinzas emanou mais uma Reforma para
a Floresta.
A Lei de Bases da Política Florestal - Lei n.º 17/96, de 17 de Agosto, foi aprovada por unanimidade na Assembleia da República |
Todavia, 2016 até prometia... António Costa, empossado no
final de 2015, retomava a Secretaria de Estado das Florestas e Desenvolvimento
Rural na arquitetura do Governo, num claro sinal político que a floresta
voltava a ocupar um lugar de destaque na ação governativa, dando expressão e
conteúdo ao texto do programa do Governo. Meses mais tarde, em Mação, António
Costa presidia às cerimónias oficiais do Dia Internacional das Florestas e reforçava
esse sinal político quando pedia “uma floresta à prova de fogo”.
No entanto, um verão mais severo iria demonstrar que a
floresta portuguesa não é à prova de fogo, pondo a descoberto todas as
fragilidades estruturais, tantas vezes diagnosticadas. No cômputo final, foram
contabilizados mais de 150 mil hectares de área ardida, naquele que foi o pior registo
da última década. E das cinzas destes fogos, nasce a “Reforma da Floresta”.
Anunciada, por António Costa, ainda no rescaldo das chamas, em Outubro, num
Conselho de Ministros Extraordinário realizado no COTF – Lousã são aprovadas as
bases legislativas dessa Reforma.
Com esse propósito, o Governo colocou 10 medidas legislativas
em Consulta Pública, num processo inovador de participação cívica que merece
ser sublinhado, na procura do envolvimento da sociedade portuguesa no debate
sobre a floresta, que afinal não é de “todos”, mas sim da posse de milhentos
proprietários - desde as nano, mini, micro propriedades que povoam o norte e o
centro do Pais, até às empresas da industria papeleira e aos grandes
proprietários dos sistemas agro-florestais do sul do Pais.
Neste processo, tive a oportunidade de acompanhar o debate
promovido pela Ordem dos Engenheiros em torno da Reforma da Floresta. Mas,
desse debate, apesar de não ter emanado uma visão que clarificasse o papel da
Engenharia Florestal para o desenvolvimento da floresta portuguesa, ressaltou a
identificação de um conjunto de prioridades, com o fim da dupla Tutela dos
Ministérios da Agricultura e do Ambiente sobre o ICNF, no topo dessa lista.
2016, também, fica marcado pelo arranque efetivo das medidas
florestais inscritas no PDR2020 e pelo anuncio da conclusão do processo de
revisão dos Planos Regionais de Ordenamento Florestal em Março de 2017 pelo
Ministro Capoulas Santos.
Feito um breve balanço de 2016, receio que estejamos perante
mais uma oportunidade perdida para a Reforma que o Setor Florestal precisa.
Nesta reflexão socorro-me das palavras tecidas pelo meu colega Victor Louro,
autor do livro “A Floresta em Portugal -
Um apelo à inquietação cívica”, e que num debate televiso alertou para o
foco em que é preciso colocar a “Reforma da Floresta” – aumentar a rentabilidade
dos ativos florestais e resolver as falhas de funcionamento do mercado!
Na minha opinião é aqui que reside o cerne da questão
florestal e não é por acaso que Portugal é o único País da Europa onde a área
florestal regrediu, bem como é o único País do sul da Europa onde os incêndios
florestais continuam a aumentar. A floresta portuguesa está hoje mais
vulnerável que há 20 anos atrás.
É com essa preocupação que iriei assistir, em Santarém, à
ultima sessão do períplo regional do Governo sobre a “Reforma da Floresta”,
para poder ter uma opinião mais formada e informada sobre a matéria, pois
parece-me que os objetivos inscritos em 1996 na Lei de Bases da Política
Florestal ainda estão por cumprir na sua generalidade ...
Miguel Galante (Eng. Florestal)
Gazeta Rural, edição n.º 285 (10.1.2017)
Sem comentários:
Enviar um comentário